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segunda-feira, 31 de maio de 2010

O Viajante do Tempo

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O Viajante do Tempo by Gláucia Hamond Coutinho is licensed under a Creative Commons Atribuição-Uso Não-Comercial-Vedada a Criação de Obras Derivadas 3.0 Brasil License.


Outro dia conheci uma pessoa que dizia ser um viajante do tempo. O sujeito falava que tinha vindo do futuro! E é claro que eu não acreditei. Achei que o cara fosse um doido varrido. Pirado mesmo! Mas quando pedi para ele me provar o que falava, tive que acreditar nele! Ele recitou um poema de sua época futura, que era mais ou menos assim:

“Nossa! Que lindo! A primavera chegou! E isso já é visível nas roupas floridas das pessoas. Vestidos com margaridas, blusas com rosas, camisetas com pequenos detalhes floridos, bermudas com samambaias, muito verde e muitos animais estampados nas bolsas! E o céu continua cinza...

E o verão! Ah! Que alegria! Tudo muito colorido! Nas praias principalmente, é claro! Biquínis com estampas de frutas, flores e muita cor! E o céu, continua cinza...

Ai, chega o outono. Que estação maravilhosa! Todo mundo vestindo tons terra, com desenhos de folhas secas nas roupas. E muita gente no parque pintando quadros! Todos de uma natureza morta sem igual! É realmente fantástico! E o céu, continua cinza...

E quando finalmente chega o inverno, é tudo muito emocionante! O frio proporcionando a possibilidade de vestir àquelas roupas chiques! Sapato preto, casaco preto, blusa preta, calça preta e algumas peças cinzas. Assim como o céu, que continua cinza... “

Quando ele terminou seu poema, disse duas coisas que me arrepiaram os cabelos. Primeiro ele olhou a sua volta e disse:

“Que engraçado! Aqui dá pra se notar as estações do ano sem ter que olhar para as roupas das pessoas!”

Mas a outra frase que ele mencionou, além de me arrepiar, deixou-me sem palavras:

“Que curioso, o céu está ficando cinza...”

O sujeito então, deu as costas e seguiu seu caminho, com uma alegria sem igual estampada na face. Parecia uma criança em dia de festa! Sorria para tudo que via! Até mesmo para a fumaça que saía dos escapamentos dos carros.

E eu, continua alí no mesmo lugar. Parada. Pensando. Até que notei que o homem havia desaparecido.

Foi nessa hora que me veio uma pergunta a mente:

Será que ainda dá tempo?

quarta-feira, 19 de maio de 2010

Morfeu, o Zumbi e a Bola de Pelos


Bem, são exatamente 12 horas e vinte e seis minutos do dia 19 de maio de 2010. E este “zumbi” que vos escreve, intitulou-se desta maneira por ter sido acordada às 3 e poucas da madruga e não ter conseguido voltar a dormir. O porquê disso? Bola de pelos... Isso mesmo que você acabou de ler! Bola de pelos! Estava eu dormindo, o sono dos justos, quando fui acordada abruptamente pela tosse felina da minha gata Jolie. E o motivo da tosse? Bola de pelos... Na garganta. E isso é normal acontecer com os gatos, pois estes estão sempre lambendo seus pelos e os pelos de seus amigos peludos. É um lambe-lambe danado! E só poderia ser a Jolie tossindo, pois o Tico é meio porquinho e não liga muito pra higiene. Jolie que é responsável pela limpeza de ambos! Sendo assim, ela que tem mais bola de pelos na garganta.
A verdade é que quando eu acordei com aquele barulho, tratei de procurar a Jolie para ver se poderia lhe dar alguma ajuda. Mas como eu estava “embriagada” de sono, levei algum tempo para sacar que a Jolie se encontrava debaixo de minha cama. E eu só a encontrei depois de ter percorrido a casa inteira à sua procura... (e o Tico, alheio a tudo, amolava suas unhas na lateral do meu colchão)...
Mas, foi só eu olhar pra ela e perguntar, “Jolie, o que houve?”, que a tosse parou. Sumiu. Desapareceu. E junto com ela foi-se Morfeu... Eu que estava tão confortável e acomodada em seus braços! Acho até que estava sonhando! Quando me dei conta, ele tinha dado no pé também.
E eu não entendo porque não consegui pegar no sono novamente. Até porque eu estava tão cansada que dormia como uma pedra antes de ter sido acordada pela tosse da Jolie. E sendo assim, porque Morfeu foi embora tão rápido?
Só pode existir uma explicação:
Morfeu deve ter nojo de bolas de pelos... Só pode ser isso!

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Prefiro os Animais...

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Prefiro os Animais... by Gláucia Hamond Coutinho is licensed under a Creative Commons Atribuição-Uso Não-Comercial-Vedada a Criação de Obras Derivadas 3.0 Brasil License.


Hoje acordei pensando em como sou parecida com os animais. E cada vez me sinto mais a vontade perto deles do que perto de humanos, por mais incrível e estranho que pareça. Animais são verdadeiros. Se um bicho te morde, com certeza, é por alguma boa razão, pra se defender ou por medo. Animais não esperam você virar as costas para falar mal de sua pessoa, não é verdade? Nem tão pouco, fingem algum sentimento ou mentem para você.

Fiquei horas a fio com aquela cara de quem estava pensando na morte da bezerra. E enquanto eu pensava nisso tudo, comecei a ficar meio deprimida. Essas comparações estavam indo longe demais. E para não ficar na pior, resolvi levar meus pensamentos para um lado mais engraçado. E comecei a visualizar, ironicamente, minhas semelhanças com os bichos. E fui vendo que temos muitas coisas em comum! Se você parar para pensar, vai ver que em quase tudo fazemos alguma alusão aos bichos. Nem que seja apenas um simples dito popular.

Pra começar, gosto de rir pra cachorro! Até pareço uma hiena!

E quando estou trabalhando em algo que gosto muito, canto mais que um rouxinol.

Outra coisa interessante é que vivo com uma fome de leão. Como igual a um avestruz, apesar de não querer virar uma baleia. E fico impressionada com pessoas que comem feito um passarinho e ainda dizem: “ai, parece até que comi um boi!”. Vamos combinar que quem come um "boi" engorda, né? Não existe quem coma um "boi" e fique cada vez mais magrinho...

Quando vou fazer compras, ando mais que um camelo no deserto. Isso, toda mulher faz.

Aprecio as pessoas que nadam como um peixe. Aliás, talento, além de nato deve ser hereditário. Afinal, filho de peixe, peixinho é...

Sou super coruja com minha cria e ai de quem mexer com ela, viro uma leoa! Ah, e tenho olhos de lince, enxergo longe, longe...

Um dos meus melhores amigos, acreditem, é uma “libélula”. E já tive até algumas cobras como “amigas”. Muitas delas também eram sanguessugas... À propósito, tá cheio de amigo da onça soltos por aí. Estes sim, deveriam entrar em extinção!

Adoro um abraço de urso! E tenho pavor de abraço de tamanduá!

Sou mestra em receber presentes do tipo “elefante branco”. E como a cavalo dado não se olha os dentes, eu finjo que gostei e agradeço a gentileza.

Sempre achei mais prudente cada macaco ficar em seu galho. Muita gente se metendo aonde não é chamado dá confusão, ou no mínimo, alguém acaba pagando um mico. È melhor mesmo ficar cada um na sua, porque, em boca fechada não entra mosca.

Qualquer coisinha, já fico com a pulga atrás da orelha e com a cabeça cheia de minhocas. Com grilo na cuca, sabe?

Se tentarem me passar a perna, chama logo a mãe do cidadão de vaca!

Costumo ir dormir com as galinhas (por conta do horário e não em má companhia).

Às vezes, pareço até hippie, pois chamo todo mundo de “bicho”. Sacou, bicho?

Minha vizinha, que fala mais que um papagaio, diz estar vivendo a idade da loba. E que o pintinho de seu marido mais se parece com um gato de armazém _ vive deitado em cima do saco. E por conta disso, já virou “boi” na mão da cachorra. E que cachorrona! Veste-se igual uma perua e é mais exibida que um pavão! Coitado do chifrudo... A "desinibida" faz ele de gato e sapato! Aqueles dois vivem igual cão e gato! Ou seria gato e rato? De repente, o sujeito tem um bafo de onça, sei lá. Ou só pode ser um cordeirinho mesmo! Obedece a esposa igual vaquinha de presépio. Esses dois, devem ter descoberto, anos após o casamento, que levaram gato por lebre... Ou então, devem pensar: "onde fui amarrar a minha égua?"

Quando encomendo uma pizza por telefone, o entregador sempre parece ser mais lento que uma tartaruga. Dá vontade de fingir que não estou em casa na hora que ele chegar, só pra ter o prazer de vê-lo dar com os burros n´água! Hehehehehehe... Brincadeirinha.

E quando algo sai errado é porque deu zebra, não é isso?

Meu pai costumava dizer que minha mãe tinha sono de borboleta, qualquer barulhinho, por menor que fosse, ela acordava. E acordava uma fera! Brigava à beça! Mas, cão que ladra, não morde.

Se alguma engraçadinha se assanha pro lado do meu amado, já percebo semelhanças nela com aquele peixe, que já foi título de filme e que começa com a letra “P”... (preciso explicar mais?) Aí, fico uma arara e parto pra cima! Eu viro bicho!

Meu marido, que é forte como um touro, vive me chamando de gata. Deve ser por isso que eu prefiro os animais.

E, pensando bem, tem que ser mesmo animal pra viver nessa selva de pedra...

Quem não gosta de animais é porque tem sangue de barata, isso sim! Ou então é burro! Pois se um animal te escolhe como amigo, você vai desfrutar da amizade mais sincera que alguém possa ter na vida!

É certo que uma andorinha não faz verão, mas deixei aqui a minha contribuição aos meus amigos irracionais. Mas quem na verdade é irracional aqui mesmo? Sei não...

O pior é que quando alguém faz algo de muito estúpido, é chamado de animal. Como sendo uma ofensa ao autor do ato recriminado. Mas quem deveria ficar ofendido não é a pessoa em questão, mas sim, os animais, oras bolas! Onde já se viu? Comparar eles com "antas" humanas...

A verdade, nua e crua, é que não adianta tentar abrir a cabeça de bestas que não gostam de animais. É como jogar pérolas aos porcos.

Pronto! Falei e disse! E não venham cutucar a onça com vara curta porque eu defendo mesmo os animais! Já fui até injustamente chamada de ovelha negra da família. Sendo assim, já estou preparada para enfrentar qualquer lobo em pele de cordeiro. Eu sou o bicho!

Viver em harmonia com a natureza não é nenhum bicho de sete cabeças! Afinal, nós é que somos os racionais, não é verdade? Ou estou enganada?

Quem maltratar algum animal na minha frente, só tenho uma coisa a dizer: a cobra vai fumar! Trocando em miúdos, o bicho vai pegar!

Se é para defender um animal, eu falo cobras e lagartos seja lá pra quem for! Não vou deixar a vaca ir pro brejo mesmo! Faço o maior balaio de gato! Não sou de engolir sapos!

E cuidado comigo, pois eu mato a cobra e mostro o pau! No sentido figurado, claro. Pois eu não mato nem uma mosca!

E quem ainda pensa em fazer algum mal a uma animalzinho indefeso, pode ir tirando seu cavalinho da chuva, pois assim como eu, tem muita gente, que gosta de animais, de olho em vocês! Até porque, o castigo, vem sempre à cavalo...

Desculpem-me, mas hoje acordei com a macaca!

Está dado o meu recado. E quem não gostou, que chore lágrimas de crocodilo!

terça-feira, 4 de maio de 2010

O Olhar do Coração

Criei este texto ontem, durante uma aula de improvisação. Apenas detalhei uma pouco mais para dar a devida forma estética.


Dedico esta obra a todas pessoas "especiais" por natureza, ou que se tornaram "especiais" por algum motivo.


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O Olhar do Coração by Gláucia Hamond Coutinho is licensed under a Creative Commons Atribuição-Uso Não-Comercial-Vedada a Criação de Obras Derivadas 3.0 Brasil License.

Carol já era uma mulher adulta, que vivera intensamente cada pequeno momento de sua vida, quando o pior aconteceu... Ninguém teria feito tanta coisa como ela fez. Com 35 anos, ela parecia ter vivido mais do que uma pessoa de 80... Mas, a “vida” parece ter vindo cobrar o seu preço... Nada vem de graça, não é verdade? Tudo parece ter seu custo. E por conta de tantas aventuras, na maioria das vezes um tanto o quanto perigosas, Carol sofre um acidente de carro e além de cadeirante, fica cega...

Mas o que importa? Ela viveu tudo que alguém poderia viver numa única vida, não é verdade? Melhor dizendo, ela viveu mais do que alguém poderia viver em uma única vida! E essa frase: “Mas o que importa?”, era o que ela repetia, pra si mesma, sem parar, na inútil tentativa de se convencer de que, apesar do terrível mal que lhe acontecera, ela, pelo menos, viveu tudo que poderia ter vivido... Mas isso era justo? Definitivamente, ficar cadeirante e cega, não é justo para ninguém! Ninguém, por pior que seja, merece tal infortúnio. Muito menos Carol, que era uma pessoa doce, meiga, amiga, simples e rica de coração... E que coração! Enorme!

Mas, como dizem por aí, Deus escreve certo por linhas tortas... E baseado nesta frase, Carol tenta, com muito esforço, entender estas tais linhas tortas, ou onde possa estar o “certo” nisso tudo...

Mas, depois do acidente, com a cegueira, Carol começa a sentir saudades do que nunca mais voltaria a enxergar. Ser cadeirante já era um grande fardo, mas ser cega, para ela, era o fim... Como cadeirante, ela poderia, bem ou mal, dentro de um limite e com a ajuda dos outros, fazer quase tudo que fazia antes. Mas cega, nem mesmo com o auxilio dos outros, ela voltaria a saborear as belas cores da natureza.

E nesse turbilhão de pensamentos que atormentavam sua cabeça, Carol se recorda de um maravilhoso lugar que desfrutou quando ainda era uma criança de 10 anos. O avô paterno de Carol tinha uma fazenda no interior de Minas Gerais. Carol, seus primos e os filhos dos funcionários dessa fazenda, brincavam por toda propriedade sem limites. Corriam, andavam a cavalo, nadavam no rio, brincavam de esconde-esconde nas estrebarias, bebiam leite quentinho das vacas, roubavam pedaços dos queijos que ainda estavam “curando”, faziam esculturas de barro na beira do riacho e todo o tipo de brincadeira que uma criança poderia fazer num lugar tão lindo e paradisíaco como uma fazenda, cheia de maravilhas naturais sem igual.

E Carol começa a se recordar do que mais a deixava doida pra voltar nas férias àquela fazenda. Era um lugar ao qual ela nomeou, ainda criança, de “a porta secreta para o céu”. Mas o que poderia ser uma porta secreta para o céu? Nos limites da propriedade, quase na fronteira com uma outra fazenda, a paisagem parecia realmente mudar por completo. Montanhas e uma vegetação densa tomavam conta do lugar. A sensação era de haver por ali um portal dimensional onde, ao transpassá-lo, tudo poderia mudar... A própria mudança abrupta na paisagem já dava margens a uma imaginação fantástica. E o local era maravilhoso! Muitíssimas árvores, montanhas e grutas. Muitas grutas. Mas uma, em especial, fazia toda diferença... À sua entrada havia uma enorme mangueira, onde Carol, com a ajuda de um canivete, cravou suas iniciais dentro de um coração. Do lado esquerdo dessa mangueira haviam umas rochas com muito limo, pois se localizavam praticamente na entrada escura desta gruta. Mas a gruta não tinha uma abertura como as outras. A impressão que se tinha era de que, há muitos e muitos anos atrás, houve um desabamento e a entrada da gruta se fechou para sempre. Mas, se você observasse bem, na parede dessa suposta entrada, havia uma fenda. Uma fenda oval de aproximadamente uns 10 cm de comprimento. Mas com uma largura suficientemente generosa para se vislumbrar o que havia lá dentro. E quando as crianças, com a ajuda umas das outras, alcançavam a altura daquele buraco, podiam apreciar o que tinha de mais encantador naquela fazenda! Um lindo lago límpido e verdinho claro, quase azul, que refletia, em todas as paredes internas da gruta, toda resplandecência do sol, que entrava por uma grande abertura no teto daquela câmara secreta. A gruta parecia estar dentro da montanha, pois era impossível de se chegar ao topo da mesma para tentar olhar a tal abertura e ver o lago de cima, sob um outro ângulo. As crianças passavam horas se revezando para deslumbrar aquele paraíso perdido. Um elo secreto com o divino. Um portal para uma dimensão superior. Simplesmente, um lugar de paz...
Isso tudo era a descrição das crianças para aquele local onde o tempo parecia parar enquanto elas estavam por ali. E elas chegavam mesmo a acreditar em suas designações.

E toda essa visualização do passado causavam uma certa angústia em Carol. E o que ela mais queria, mais do que tudo em sua vida, era poder retornar àquele lugar maravilhoso e poder, pelo menos uma vez que fosse, olhar por entre aquela fresta... Uma fresta relativamente pequena que te dava a graça e a benção de contemplar o Éden. Se ele realmente existe, aquele era o seu lugar.

Carol, seus primos e os amiguinhos da fazenda, mantinham aquele lugar como um segredo. Até porque, os adultos não chegaram a acreditar naquelas “fantasias” de criança. E elas acharam por bem, deixar assim mesmo. Em segredo. Um mistério apenas revelado para crianças. Afinal, quem acreditaria numa gruta, com a entrada soterrada, onde havia uma fresta, por onde se olhava um lago, completamente límpido, dentro de uma montanha, com uma abertura generosa em seu teto? Só poderia ser conversa fantasiosa de criança mesmo.

E com tantas saudades enlouquecendo sua mente, Carol pede a sua mãe que a leve a antiga fazenda para poder vivenciar aquele nirvana que experimentou quando garota.

Sua mãe, sem entender o porquê daquela atitude “insana”, resolve não contestar e agraciar sua filha com este desejo um tanto o quanto extravagante, e porque não dizer, esdrúxulo.

E lá se foram elas, estrada a fora, numa pick-up, devidamente equipada para melhor atender às necessidades de Carol, rumo a Fazenda Consolação. Nome este que não teria melhor significado do que naquele exato momento.

Carol não voltava à fazenda há décadas! O que lhe causava uma certa tristeza, já que perdeu tanto tempo com aventuras inúteis e fúteis, ao invés de rever aquele lugar secreto, que agora não teria mais como poder apreciar tamanha beleza natural. E elas finalmente chegam. “Seu” Manoel, funcionário dedicado e mais antigo da fazenda, abre a porteira e libera a entrada. A fazenda agora pertencia ao tio de Carol. Foi a parte da herança que lhe foi dada por direito.

E como de costume, “seu” Manoel tira seu chapéu e faz uma “reverence” para cumprimentá-las.

_”Dia, Dona Heloisa! Dia, menina Carol! Que surpresa as senhoras por aqui!”

E auxiliadas por “seu” Manoel, e com muita dificuldade, chegaram ao local descrito por Carol. Para sua mãe, aquilo tudo parecia apenas uma vontade de criança mimada, mas que ela, por estar morrendo de compaixão da filha amada, a realiza sem maiores indagações.

E Carol começa a narrar para aonde elas deveriam seguir. E pergunta:

_”Ta vendo uma mangueira enorme?” _”Tô”. Responde a mãe. E Carol continua:

_”Foi nessa árvore aí que eu marquei minhas iniciais com um canivete. Tá vendo minhas iniciais aí? Está com um coração em volta. Tá vendo? Responde, mãe! Tá vendo?”

E a mãe diz que sim, ao passar suas mãos ao longo do suntuoso tronco e sentir nas pontas dos dedos o contorno das letrinhas dentro do coração – CHC – Carolina Herbert Castillo. Curiosa formação. Um nome brasileiro, seguido de um inglês e outro espanhol. Emoldurados por um coração. Um coração, a heart, e, un corazón... “CHC”...

Carol começa a se emocionar... E pede pra sua mãe achar a pequena fresta, por onde ela, seus primos e as crianças da fazenda, olhavam e admiravam o lindo e misterioso lago. E com muita dificuldade, ela encontra o pequeno buraquinho e olha por ele. Mas nada vê... O que ela vê é apenas um monte de pedras empilhadas, como se algum desmoronamento tivesse acontecido e encoberto aquele lago por inteiro. Mas, realmente, uma grande abertura no teto, ainda era possível de se notar. E era exatamente por ali que o sol penetrava no ambiente, iluminando tudo por dentro. E sua mãe diz:

_”Não tem nada aqui. Só pedras. Porque insiste nessa fantasia de criança?”

E Carol se desespera, começa a chorar e berra:

_”Como não tem nada? Você não tá olhando no ângulo certo! Inclina a cabeça um pouco para baixo, vira o rosto meio de lado pra conseguir olhar o lago direito! Tenho certeza do que estou falando! Eu sempre fazia isso! E eu era pequena, precisava da ajuda dos outros pra olhar! Como você, que tem uma altura razoável, não consegue enxergar? Vocês sempre duvidaram da existência desse lugar! A verdade é essa! Mas nunca se propuseram a averiguar se ele realmente existia!”

Sua mãe nota o desespero da filha e tenta confortá-la, fingindo ver o que na verdade não via. E diz:

_”Ah, tem razão! Agora sim, estou vendo melhor! Eu vejo um lago! Um lindo lago!”

E Carol, com o rosto todo banhado de lágrimas, fala confortada:

_”Eu não disse a você? Este lago não é lindo? Não é maravilhoso? Não é bonito de verdade? Não me lembro de ter visto algo tão bonito em toda minha vida! Agora você tá vendo o que eu sempre te falei e nunca me acreditou! Esse é o lugar mais maravilhoso que meus olhos um dia puderam deslumbrar!”

Carol se sente como se tivesse voltado no tempo... Como se realmente pudesse ver o que via no passado. Na sua doce infância na fazenda. Quando ela mal conseguia aguardar a chegada das férias para desfrutar daquele paraíso.

E a mãe, meio sem graça, e emocionada também, responde:

_”É, minha filha, você tinha mesmo razão. Esse lugar é maravilhoso. Muito bonito mesmo! Chega a doer meu coração!” Dor esta que realmente acontecia, mas por outro motivo... Não pela maravilha do que dizia ver, até porque nada se via, mas pelo fato de mentir para tentar dar algum alento e conforto ao coração da filha tão sofrida...

De repente, o choro compulsivo de Carol dá uma trégua. Mas, ainda emocionada, diz algumas últimas palavras antes de deixar o local:

_”Mãe, agora podemos ir embora. Já vi o que queria tanto ver. Eu vi pelos seus olhos. Você viu com os olhos e eu vi com o coração...”

Sua mãe emociona-se com essas palavras e segue em frente, empurrando a cadeira de rodas da filha.

Quando estavam acomodando as coisas para entrar na pick-up e voltar para a cidade, “seu” Manoel, aproveitando um momento de distração de Dona Heloisa, segura o braço da jovem e fala baixinho para que somente ela escutasse o que desejava tanto dizer:

_”Carol, minha menina. Eu também conhecia aquele lago! Sempre que me sobrava um tempinho na lida, eu ia descansar por lá, sabia?”

Carol, ao ouvir isso, deixa algumas lágrimas escorrerem pela face, sorri carinhosamente e aperta as mãos de “seu” Manoel, sem dizer uma única palavra. Seu sorriso já dizia tudo.

E lá se foi a pick-up, deixando um rastro de poeira para trás. E “seu” Manoel continuava ali, no meio da estrada, pensativo, olhando a pick-up desaparecer na estrada de terra.

E eu pergunto a vocês:

Será que aquele lugar, em algum momento do tempo, realmente existiu, ou foi apenas fruto da gigantesca imaginação daquelas crianças?

E quando finalmente a pick-up desaparece por inteiro na última curva da estrada, “seu” Manoel, tira o chapéu de vaqueiro, coça a cabeça e fala com seus botões:

_”Mardito abalo sísmico! Cabô com a alegria da criançada”...